segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

Entrevista com Massu - O Capitão do 1º título sergipano do C.S.Sergipe

Entrevista com Massu, capitão do Club Sportivo Sergipe e da Seleção Sergipana durante a década de 1920 e início da década de 1930 para o Correio de Aracaju, publicada no dia 24 de outubro de 1939.

Transcrição feita por Davi Tenório através da edição digitalizada encontrada no sítio eletrônico: Jornais de Sergipe: Correio de Aracaju (ufs.br)

 

Massu, “half” esquerdo da velha guarda do Sergipe relembra os áureos tempos do futebol Sergipano.

Não deixa de constituir um acontecimento interessante, relembrarem-se fatos vividos em épocas passadas, fazendo o nosso espírito sobrepairar retrospectivamente, trazendo-nos à mente em uma nota de tristeza e saudade, os velhos tempos que não mais voltam. No esporte, principalmente, essa curiosidade natural assume aspecto duplamente interessante pelas várias mutações do tempo.

Maximino Silva, ou “Massú”, como é conhecido, foi uma das maiores glórias do nosso futebol, sendo ainda hoje lembrado com simpatia, como um exemplo de disciplina, cavalheirismo e educação esportiva e social. Seria, pois, interessante entrevistar o antigo jogador que dedicou todo o seu ardor na defesa da gloriosa bandeira do “C.S.Sergipe”. Não pensem os leitores, por nos referir ao passado, que vamos encontrar um velhinho de cachimbo à boca, olhos lacrimejantes a carpir saudoso, recordando os áureos tempos que se passaram. Absolutamente! Massu conta atualmente com 34 anos de idade, em plena juventude, portanto, e desenvolvendo sua atividade com dinamismo no Posto de Lubrificação (ilegível). A nossa reportagem foi feliz encontrando em Massu a melhor boa vontade em atender-nos. Abordado, o antigo crack começou logo a desfiar o infindo rosário da sua brilhante, vitoriosa e exemplar carreira esportiva:

 



Detalhe para os uniformes dos jogadores na década de 1920, período em que Massu iniciou sua carreira. Infelizmente, não temos a relação dos nomes desses atletas. 

Massu - Joguei a minha primeira partida de futebol na ponta direita, em 1920, envergando a querida camisa do Sergipe, onde atuei durante todo o tempo que permaneci em contato com a bola, mais ou menos 14 anos. Digo bem 14 anos, porque em 1934 indo o Sergipe a Penedo e não tendo ainda um substituto para a minha posição desde 1933 que deixara de jogar, fui prestar o meu último serviço à bandeira rubra. Como disse, a primeira partida joguei de ponta direita, porém da segunda em diante, passei a jogar de médio esquerdo, posição que ocupei até abandonar o futebol por não dispor de tempo para isso. Hoje nem sequer vou ao campo, porém a minha dedicação pelo Sergipe é imorredoira.

Correio de Aracaju – Qual o melhor jogador do seu tempo e atualmente?

Massu – Manoel Augusto, um center-half que possuía as qualidades essências a um perfeito “futeboler”. Ótima colocação, distribuidor impecável. “tijoleiro” afamado, Manoel Augusto naquela época foi uma maravilha. Era irmão de Candinho, ex meia esquerda do Sergipe, que também foi um grande jogador. Atualmente considero Américo do Cotinguiba o crack absoluto do Estado.

Correio de Aracaju – Que diz do futebol de hoje?

Massu – Hoje verdadeiramente existe mais é interesse e nenhum ardor. Acabou-se esta história de dedicação por clube como antigamente.

Correio de Aracaju – Foi campeão alguma vez?

Massu sorri, um sorriso largo e responde significativamente - Apenas em 1922, 1924, 1927, 1928, 1929, 1932 e 1933. Sempre pelo meu querido Sergipe.


O Sergipe campeão de 1932. Infelizmente, não identificamos até o momento os jogadores presentes na foto. Provavelmente, Massu está presente na imagem, pois era o capitão rubro na campanha. 


Correio de Aracaju – Formou alguma vez em selecionados?

Massu – Sim. Dentro do Estado de 1922 a 1929. Em jogos interestaduais, formei no “scratch” que derrotou os paraibanos por 6 x 1, isto em 1929. Neste mesmo ano, perdemos para os baianos de 8 a 2. Sinto prazer em dizer ao caro repórter que durante toda a minha vida esportiva fui sempre “captain” do meu clube, como também dos “scratches” em que formava. Esta distinção sempre tive.

Correio de Aracaju – Tem alguma recordação agradável da sua carreira?

Massu – Inúmeras, por exemplo a excursão do Sergipe a Maceió em 1923 para jogar com o Centro Sportivo Alagoano (CSA), foi um acontecimento tão importante que jamais esquecerei. Tivemos uma manifestação de acolhimento entusiástica que ainda hoje recordo-me com satisfação. Lembro-me também envaidecido do concurso para a escolha do melhor jogador do Estado, no qual fui premiado com medalha de ouro. Outro acontecimento, também de grata recordação, foi a vitória do Sergipe sobre o “scratch” cearense por 1 x 0, depois do nosso selecionado ter perdido por 2 x 1. Isso em 1925, aqui em Aracaju. Nesse jogo, o Sergipe reabilitou o futebol do nosso querido Estado.

Correio de Aracaju – Tem alguma recordação triste do futebol?

A fisionomia de Massu transforma-se repentinamente, passando de alegria para tristeza. Olha melancolicamente para o repórter do Correio, suspira, como que desabafando uma grande dor que lhe viera d’alma e fala com tristeza - Sim. Jamais me esquecerei da trágica morte de Crinho, ponta direita do Sergipe. Foi mais ou menos em 1929. Não tenho absoluta certeza. O Sergipe estava realizando um treino, numa tarde de sol causticante. Eu estava marcando Crinho, quando ele se apodera da bola e escapa (era um relâmpago) na direção do gol guarnecido por Maneca, deixando me atrás. Na carreira, a bola, impelida pelo bico da chuteira, adianta-se um pouco, mostrando-se favorável à Maneca. O jovem e infeliz ponta direita não para. Maneca arroja-se aos seus pés e entrechocam-se violentamente. Presenciai então um espetáculo terrível. De um lado, Maneco com o queixo deslocado, impossibilitado de falar, se esvaindo em sangue pelos ouvidos. Do outro, Crinho que recebe uma forte pancada na fronte jazia sem gemidos. Daí foram para a Assistência Pública e 5 horas depois, isto é, as 22 horas, o infeliz Crinho expirava, cercado de todos os seus amigos e fãs. Pobre Crinho! Tão cedo em circunstâncias tão trágicas, a morte roubara o nosso convívio.

Massu, agora, não parece o mesmo de quando iniciamos a entrevista. Calado, olhando fixamente para o solo, balança automaticamente a cabeça, como se estivesse presenciando o trágico quadro de tantos anos passados. A nossa última pergunta tocara-lhe profunda e dolorosamente na alma.

Pedimos desculpas, agradecemos e com um abraço, despedimo-nos do antigo “crack” do Sergipe.

Um comentário:

  1. Nessa entrevista está estampado o verdadeiro sentimento e paixão pela equipe RUBRA.

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