E
o Sergipe, heim!?
Por Gustavo Tenório
Num sábado qualquer, em
um povoado de Japoatã, durante uma confraternização familiar, me deparei com
alguns parentes distantes dos quais alguns eu não imaginava e outros sabia
apenas de nome. Cumprimentaram-me e, após descobrirem por algum primo sobre o
meu Gipãonismo, logo me indagaram: “e o Sergipe, heim!?”, como que esperando
uma desculpa ou um pronunciamento oficial de minha parte. Longe de ser
presidente do clube, lhes respondi com um riso constrangido antecedido de uma respiração
funda – aquela pegada de fôlego que antecede uma desculpa esfarrapada. Não
tenho resposta definitiva, é óbvio. Mas venho pensando sobre o longo drama do
Gipão, somatizado neste ano de 2025.
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Foto: Carine Mangueira |
Responder que a culpa dos
constantes fracassos é o dinheiro tem a sua razão, mas é insuficiente. Um
desses parentes contestou que a diretoria “não me dá perspectiva alguma!”.
Perguntei-lhe qual perspectiva queria e ele me disse “uma SAF”. Achei inusitado
e, ao mesmo tempo, percebi como o horizonte do torcedor brasileiro tem se
resumido à venda dos clubes para algum ricaço que queira injetar dinheiro ao
deus-dará. Mas até nesse delírio SAFiano, quem compraria o Sergipe? Lembrei até
de um velho amigo, capixaba botafoguense, que alega que se não fosse o tal do
Textor, o time continuaria falido. Ganharam uma libertadores, né? Mas até
quando?
Posso estar bastante
pessimista, é verdade. Aliás, acho que me tornei aquile torcedor que mais
temia: o ranzinza-pessimista-derrotista-deprimido. Ou, em minha defesa de mim
mesmo, talvez só deprimido. Ao mesmo tempo, essa ânsia por SAF’s não me seduz
tanto (neste momento, o meu amigo capixaba-botafoguense soltou uma risada
irônica). Como diria o jornalista Irlan Simões, o torcedor brasileiro não quer
uma SAF: quer um “sugar daddy” despejando dinheiro para contratações
voluptuosas. E, sobre dinheiro, sabemos o drama que é a captação de patrocínios
para o Sergipe. Empresas gigantes como a Maratá não patrocinam mais os times do
estado. Aliás, mesmo quando o faziam, os valores era uma grana bem mirrada. (O
curioso é que, aqui em Alagoas, as pessoas, como o camarada taxista da lotação
que me leva de Maceió a Cajueiro, pensam que o estado de Sergipe é uma potência
industrial e comercial: “como que pode um estado cheio de indústria e de
empresas não tem um patrocinador bom para o Sergipe!?”, meu amigo, queria essa
pujança investindo no meu Gipão, viu...). Pensando na ótica dessas empresas,
pergunto-me se há um retorno de imagem que compense um eventual e gordo
patrocínio. Jogamos, neste ano de 2025, o Campeonato Sergipano, a Copa do
Brasil e a Série D. A vitrine do campeonato estadual, como se supõe, se resume
ao estado de Sergipe. A Série D, ainda que nacionalizada, tem pouca
visibilidade. A Copa do Brasil, por sua vez, tem algum potencial de
visibilidade para as marcas, caso o time consiga passar de fases – coisa que há
muito não vemos, além do azar que nos depara com adversários mais poderosos.
Continuando o ar
melancólico e pessimista do texto, um dos fenômenos que mais me preocupa com o
Sergipe é a fidelização e presença do clube junto aos torcedores e à população
aracajuana e sergipana. Nossa presença nos jogos, diga-se, tem sido bem
reduzida. São os de sempre, ao melhor estilo trapo argentino: “Los de
Siempre!”. Jogos com mil torcedores nas arquibancadas às vezes é até
comemorado. Triste. É certo que times ruins afastam o público, mas tanto assim?
O tal do torcedor-misto, por mais que seu time paulista ou carioca esteja numa
péssima fase, não deixa de falá-lo nem de vivê-lo. Penso que todas as gestões
do Club Sportivo Sergipe neste século não se atentaram, com a devida
intensidade, à fidelização do torcedor colorado. Esquecem-se do torcedor.
Apenas os vê como um sócio-torcedor que paga a sua mensalidade em troca de
desconto na loja oficial ou de entrada gratuita nos jogos. Mas isso é pouco – e
nos tornamos poucos, no final das contas.
O Sergipe precisa estar
na rotina de sua torcida; estar presente a todo momento. Ser visto e ter a sua
ausência sentida quando não está. Não só o capital financeiro é importante, mas
também o capital afetivo. Aliás, com este último, o primeiro acaba sendo
conseqüência. Em suma, o Sergipe precisa recriar ou reviver a sua comunidade. O
clube parece distante, frio e excessivamente burocrático com e para a sua
torcida. Qual prazer resta para a torcida? Um desconto de 15% na compra da
camisa oficial? Um modelo ultrapassado de festa anual para apresentar o elenco
(quando apresenta)? Ora, o Siqueira Campos, mesmo, não parece ser mais assim
tão colorado. Pelo andar da carruagem, até o bairro onde nos sediamos foi
perdido.
Tem se esvaído o
sentimento de ser torcedor colorado. Boas campanhas e conquistas ajudam e
muito, insisto. Mas, diante de um cenário de apatia e falta de rumo da gestão
atual, a busca pela recriação de um elo com a comunidade rubra se faz urgente.
Iniciativas como o retorno da escolinha de futebol foi um passo importante,
assim como a parceria com o centro de treinamento de ginástica rítmica e a
escolinha de natação. Mas não se pode parar aí. Trazer estudantes e a
comunidade circunvizinha para o João Hora, bem como ir até eles podem ser um
outro passo importante. Estar ao lado da comunidade fará com que a comunidade
esteja sempre consigo. Há exemplos interessantes no Brasil e na América do Sul
que podem inspirar – vide a barreira do Vasco no Rio de Janeiro e os bairros de
Buenos Aires que vivem e se orgulham de seus clubes. Tem-se que ir além do
pragmatismo da gestão do time de futebol e pular os muros do João Hora para
encontrar o torcedor no seu dia-a-dia, ou num povoado perdido do interior do
estado.
No fim da festa no
coração de Japoatã, eu ligeiramente bêbado, após um hiato Tchekoviano, sugeri
um papo sóbrio com aquele primo desconhecido em um momento futuro. Descobri
outros primos colorados que há muito não freqüentam os jogos e que rememoram
anos de glórias passadas. Precisamos de presente e de futuro. Necessitamos
conquistar novamente os corações e mentes rubras.
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