quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025

 

E o Sergipe, heim!?

Por Gustavo Tenório


Num sábado qualquer, em um povoado de Japoatã, durante uma confraternização familiar, me deparei com alguns parentes distantes dos quais alguns eu não imaginava e outros sabia apenas de nome. Cumprimentaram-me e, após descobrirem por algum primo sobre o meu Gipãonismo, logo me indagaram: “e o Sergipe, heim!?”, como que esperando uma desculpa ou um pronunciamento oficial de minha parte. Longe de ser presidente do clube, lhes respondi com um riso constrangido antecedido de uma respiração funda – aquela pegada de fôlego que antecede uma desculpa esfarrapada. Não tenho resposta definitiva, é óbvio. Mas venho pensando sobre o longo drama do Gipão, somatizado neste ano de 2025.


Foto: Carine Mangueira

Responder que a culpa dos constantes fracassos é o dinheiro tem a sua razão, mas é insuficiente. Um desses parentes contestou que a diretoria “não me dá perspectiva alguma!”. Perguntei-lhe qual perspectiva queria e ele me disse “uma SAF”. Achei inusitado e, ao mesmo tempo, percebi como o horizonte do torcedor brasileiro tem se resumido à venda dos clubes para algum ricaço que queira injetar dinheiro ao deus-dará. Mas até nesse delírio SAFiano, quem compraria o Sergipe? Lembrei até de um velho amigo, capixaba botafoguense, que alega que se não fosse o tal do Textor, o time continuaria falido. Ganharam uma libertadores, né? Mas até quando?

Posso estar bastante pessimista, é verdade. Aliás, acho que me tornei aquile torcedor que mais temia: o ranzinza-pessimista-derrotista-deprimido. Ou, em minha defesa de mim mesmo, talvez só deprimido. Ao mesmo tempo, essa ânsia por SAF’s não me seduz tanto (neste momento, o meu amigo capixaba-botafoguense soltou uma risada irônica). Como diria o jornalista Irlan Simões, o torcedor brasileiro não quer uma SAF: quer um “sugar daddy” despejando dinheiro para contratações voluptuosas. E, sobre dinheiro, sabemos o drama que é a captação de patrocínios para o Sergipe. Empresas gigantes como a Maratá não patrocinam mais os times do estado. Aliás, mesmo quando o faziam, os valores era uma grana bem mirrada. (O curioso é que, aqui em Alagoas, as pessoas, como o camarada taxista da lotação que me leva de Maceió a Cajueiro, pensam que o estado de Sergipe é uma potência industrial e comercial: “como que pode um estado cheio de indústria e de empresas não tem um patrocinador bom para o Sergipe!?”, meu amigo, queria essa pujança investindo no meu Gipão, viu...). Pensando na ótica dessas empresas, pergunto-me se há um retorno de imagem que compense um eventual e gordo patrocínio. Jogamos, neste ano de 2025, o Campeonato Sergipano, a Copa do Brasil e a Série D. A vitrine do campeonato estadual, como se supõe, se resume ao estado de Sergipe. A Série D, ainda que nacionalizada, tem pouca visibilidade. A Copa do Brasil, por sua vez, tem algum potencial de visibilidade para as marcas, caso o time consiga passar de fases – coisa que há muito não vemos, além do azar que nos depara com adversários mais poderosos.

Continuando o ar melancólico e pessimista do texto, um dos fenômenos que mais me preocupa com o Sergipe é a fidelização e presença do clube junto aos torcedores e à população aracajuana e sergipana. Nossa presença nos jogos, diga-se, tem sido bem reduzida. São os de sempre, ao melhor estilo trapo argentino: “Los de Siempre!”. Jogos com mil torcedores nas arquibancadas às vezes é até comemorado. Triste. É certo que times ruins afastam o público, mas tanto assim? O tal do torcedor-misto, por mais que seu time paulista ou carioca esteja numa péssima fase, não deixa de falá-lo nem de vivê-lo. Penso que todas as gestões do Club Sportivo Sergipe neste século não se atentaram, com a devida intensidade, à fidelização do torcedor colorado. Esquecem-se do torcedor. Apenas os vê como um sócio-torcedor que paga a sua mensalidade em troca de desconto na loja oficial ou de entrada gratuita nos jogos. Mas isso é pouco – e nos tornamos poucos, no final das contas.

O Sergipe precisa estar na rotina de sua torcida; estar presente a todo momento. Ser visto e ter a sua ausência sentida quando não está. Não só o capital financeiro é importante, mas também o capital afetivo. Aliás, com este último, o primeiro acaba sendo conseqüência. Em suma, o Sergipe precisa recriar ou reviver a sua comunidade. O clube parece distante, frio e excessivamente burocrático com e para a sua torcida. Qual prazer resta para a torcida? Um desconto de 15% na compra da camisa oficial? Um modelo ultrapassado de festa anual para apresentar o elenco (quando apresenta)? Ora, o Siqueira Campos, mesmo, não parece ser mais assim tão colorado. Pelo andar da carruagem, até o bairro onde nos sediamos foi perdido.

Tem se esvaído o sentimento de ser torcedor colorado. Boas campanhas e conquistas ajudam e muito, insisto. Mas, diante de um cenário de apatia e falta de rumo da gestão atual, a busca pela recriação de um elo com a comunidade rubra se faz urgente. Iniciativas como o retorno da escolinha de futebol foi um passo importante, assim como a parceria com o centro de treinamento de ginástica rítmica e a escolinha de natação. Mas não se pode parar aí. Trazer estudantes e a comunidade circunvizinha para o João Hora, bem como ir até eles podem ser um outro passo importante. Estar ao lado da comunidade fará com que a comunidade esteja sempre consigo. Há exemplos interessantes no Brasil e na América do Sul que podem inspirar – vide a barreira do Vasco no Rio de Janeiro e os bairros de Buenos Aires que vivem e se orgulham de seus clubes. Tem-se que ir além do pragmatismo da gestão do time de futebol e pular os muros do João Hora para encontrar o torcedor no seu dia-a-dia, ou num povoado perdido do interior do estado.

No fim da festa no coração de Japoatã, eu ligeiramente bêbado, após um hiato Tchekoviano, sugeri um papo sóbrio com aquele primo desconhecido em um momento futuro. Descobri outros primos colorados que há muito não freqüentam os jogos e que rememoram anos de glórias passadas. Precisamos de presente e de futuro. Necessitamos conquistar novamente os corações e mentes rubras.

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