Por Davi Tenório
Uma instituição que atravessa
110 anos exercendo relevante papel sócio-cultural jamais morrerá. Há mais de um
século, o Club Sportivo Sergipe presencia as diversas manifestações do
cotidiano do nosso estado, seja na esfera esportiva, na social, na cultural e
na política. O Sergipe não esteve em uma posição passiva: foi pioneiro e
atuante, moldando-se e ligando-se às novidades e às necessidades de cada período
histórico. Esta característica, mais do que nunca, deve ser posta em ação no
difícil presente, observando e, sobretudo, respeitando os exemplos da sua
grande história.
(Foto: Davi Tenório) |
Em uma época na qual a pacata província se deparava com as instigantes novidades vindas de fora, jovens idealistas sonharam com a implementação de uma cultura social e esportiva vista nos grandes centros do país, porém com uma identidade genuinamente sergipana. A princípio, lançaram-se sobre as águas do rio que não só nos banha, mas que batiza os filhos desta terra. Nesta fase, ainda havia muito caminho a ser percorrido, além de barreiras a serem ultrapassadas. Uma instituição que almeja ser longeva e inserida na sociedade precisa se abrir a ela. Assim, esses jovens visionários cederam aos apelos de um esporte que se popularizava em campos improvisados da cidade. Já no primeiro contato com o futebol, contamos com a bravura e o talento de nomes como Roque, atleta negro e simples “contínuo” (o “office-boy” dos nossos tempos) do Banco do Brasil, que nos honrou não só com o primeiro gol da História Rubra, mas como nosso primeiro ídolo e artilheiro[1] [2].
Fora das águas e dos campos
improvisados, contamos com os esforços de desportistas que buscaram a
construção de uma verdadeira praça esportiva[3]. Surge, então, o antigo
Estádio Adolpho Rollemberg, colocando Aracaju à frente de muitas capitais do
Nordeste[4]. Foi justamente neste novo
e moderno gramado que o povo pôde testemunhar o brilho de uma equipe composta
majoritariamente de filhos da terra, em oposição aos clubes rivais, repletos de
jogadores importados da Bahia. Com a garra do talento local, conquistamos o
primeiro de muitos campeonatos no ano de 1922, assim como a preferência dos
aracajuanos. Após meio século, novamente desportistas rubros voltariam a medir
forças e a levantar alicerces para a construção de uma nova casa. Com o suor e
os braços dos próprios torcedores construímos o maior estádio de um clube
sergipano: o Complexo do João Hora de Oliveira.
Este mesmo clube logo abraçaria
causas relevantes, como a introdução da formação de atletas juvenis e a defesa da
profissionalização do futebol local,
inclusive ao inscrever os dois primeiros atletas no regime profissional: Zé
Alvino e Niltinho[5].
O Sergipe também abriria os seus quadros sociais aos torcedores menos
abastados, fundamentais para oxigenar e elevar as estruturas do clube[6] [7]. Estas mesmas portas
também foram abertas àqueles que sofreram perseguições políticas no período
mais obscuro da História do Brasil, mesmo quando se tratavam de ex-dirigentes
dos maiores rivais[8]
[9]. Atos nobres e corajosos
que renderam não só títulos em campo, como também demonstrou que o esporte é um
mecanismo de inclusão, de tolerância e de convívio com a pluralidade.
Por fim, é preciso destacar o nosso
maior patrimônio: os inúmeros apaixonados e fiéis torcedores. Quando olhamos as
arquibancadas e notamos a presença de um ou milhares de torcedores, lembramos
daquele sonho dos pioneiros que almejavam a construção de um sentimento. As
arquibancadas poderão passar um tempo vazias, mas logo nos lembraremos das
eternas mãos que ajudaram a construí-las, a recuperá-las e a ocupá-las.
[1] Ver a coluna do
Fernando Porto na edição de 20 de setembro de 1958 do jornal A Cruzada.
[3] VIANA FILGO, F.A.
A História do Futebol Sergipano: A História completa desde 1907 a 1960 – UNIT,
2014. p. 53-54.
[4] A capital baiana ,
por exemplo, só inaugurou um campo mais moderno após seis meses com o
surgimento do Campo da Graça.
[5] VIANA FILGO, F.A.
A História do Futebol Sergipano: A História completa desde 1907 a 1960 – UNIT,
2014. p. 317-320.
[6] Ver a entrevista
com o sócio, torcedor e ex-jogador Jocely Pereira Torres no primeiro fascículo
da Revista Gigante Rubro. Disponível em : http://almanaquedogipao.blogspot.com/2019/03/revista-gigante-rubro-1977.html
[7] Ver a história
sobre o ex-sócio proprietário Pedro Hilário. Disponível em: http://almanaquedogipao.blogspot.com/2019/03/relembrar-para-nao-repetir-golpe.html
[8] O ex-dirigente
vascaíno e ex-presidente da Federação Robério García fora deposto deste último
cargo com o Golpe Militar de 1964 e assumiu no ano de 1966 a presidência do
Club Sportivo Sergipe, sendo campeão no ano de 1967 e exercendo importante
papel na construção do Estádio João Hora. Disponível em: < http://almanaquedogipao.blogspot.com/2019/03/relembrar-para-nao-repetir-golpe.html >
[9] Houve também o
caso do ex-presidente do Confiança Aerton Silva, preso durante a Ditadura
Militar e posteriormente acolhido no Club Sportivo Sergipe onde fora bicampeão
sergipano como presidente do clube em 1974/1975. Disponível em:< https://globoesporte.globo.com/se/futebol/noticia/unico-na-historia-aerton-silva-foi-campeao-como-presidente-do-confianca-e-do-sergipe.ghtml >
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